O governo brasileiro anunciou no domingo (8) a intenção de tributar em 5% investimentos atualmente isentos de Imposto de Renda (IR), como a Letra de Crédito Imobiliário (LCI). Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e consequentemente Cédulas de Produto Rural (R). A medida, que será implementada via Medida Provisória (MP), visa compensar a provável revogação do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), anunciado há duas semanas e que gerou forte reação negativa do mercado e do Congresso.
Esta semana examino os impactos dessa decisão no agronegócio e na economia brasileira, identificando erros estratégicos do governo e projetando consequências de curto e longo prazo.
A Letra de Crédito Imobiliário (LCI) e a Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) são títulos de renda fixa emitidos por instituições financeiras com o compromisso de direcionar os recursos captados para os setores imobiliário e agrícola, respectivamente. Já a Cédula de Produto Rural (R) é um título emitido por produtores rurais ou cooperativas para obtenção de recursos para financiamento da produção.
Estes instrumentos foram criados com isenção tributária justamente para estimular o direcionamento de capital privado para setores estratégicos da economia, reduzindo a dependência de recursos públicos e subsidiados. A isenção de IR tornava esses títulos atrativos para investidores, permitindo taxas competitivas para os tomadores de crédito.
Conforme anunciado pelo Ministro da Fazenda, a tributação de 5% sobre o rendimento desses títulos será aplicada apenas às novas emissões a partir de 2026, preservando a isenção para o estoque atual. Além dessa medida, o governo também propôs:
Aumento da tributação da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para instituições financeiras de 9% para 15% e 20%
Elevação da taxação das apostas esportivas de 12% para 18%
Redução do IOF sobre crédito para empresas e operações de risco sacado
Encarecimento do crédito rural
A tributação das LCAs e Rs terá impacto direto no custo do crédito para o agronegócio. Segundo a Frente Parlamentar da Agropecuária, “as LCAs são a base do financiamento agropecuário e estruturam o Plano Safra”. Com a nova tributação, estima-se que as taxas de juros desses instrumentos precisarão aumentar para manter sua atratividade frente a outros investimentos.
O setor agropecuário, que já enfrenta margens pressionadas por custos crescentes de insumos e volatilidade de preços internacionais, terá um componente adicional de pressão financeira. Produtores menores e médios, com menor o a linhas subsidiadas, serão os mais afetados.
Redução potencial na oferta de crédito
A perda de competitividade das LCAs e Rs pode resultar em migração de recursos para outros instrumentos financeiros, reduzindo o volume de capital disponível para o agronegócio. Isso ocorre em um momento crítico de planejamento para a próxima safra, podendo afetar decisões de plantio e investimento.
Representantes do setor alertam que a medida pode dificultar o financiamento da safra e comprometer a expansão da produção agrícola brasileira, justamente quando o país busca ampliar sua participação no mercado global de alimentos.
Para os investidores, a tributação reduz a atratividade relativa desses títulos. Segundo a analista Larissa Quaresma, da Empiricus Research, “a tributação para LCIs e LCAs prevista por enquanto é de 5%, ainda inferior à menor alíquota da tabela de IR para renda fixa (de 15%). Em questões de tributação, são os investimentos mais atrativos, apesar de agora estarem menos”.
No entanto, o impacto vai além da simples comparação de alíquotas. A mudança representa uma quebra de previsibilidade regulatória, elemento fundamental para decisões de investimento de longo prazo. A percepção de que regras tributárias podem ser alteradas abruptamente aumenta o prêmio de risco exigido pelos investidores.
Pressão inflacionária indireta
O encarecimento do crédito para setores produtivos estratégicos pode gerar pressões inflacionárias indiretas. No caso do agronegócio, custos maiores de financiamento tendem a ser reados aos preços dos alimentos. No setor imobiliário, o impacto seria no custo da moradia.
Esse efeito é particularmente preocupante em um cenário de juros elevados e inflação ainda não completamente controlada, podendo comprometer os esforços de estabilização econômica.
Contradição com políticas de incentivo setorial
A tributação de instrumentos criados especificamente para incentivar setores estratégicos contradiz outras políticas governamentais de estímulo ao agronegócio e à habitação. O governo anuncia regularmente medidas de apoio a esses setores, como o Plano Safra e programas habitacionais, mas simultaneamente reduz a eficácia de mecanismos de financiamento privado.
Esta incoerência gera confusão no mercado e compromete a credibilidade da política econômica, sugerindo que decisões fiscais emergenciais prevalecem sobre o planejamento estratégico de longo prazo.
O anúncio da medida ocorre em momento particularmente sensível para o agronegócio, que está planejando investimentos para a próxima safra. A ausência de diálogo prévio com os setores afetados e a falta de um período de transição adequado amplificam os efeitos negativos da decisão.
A percepção de que a medida foi tomada de forma apressada, como resposta à necessidade de compensar a revogação do aumento do IOF, sugere improvisação na política fiscal, elemento que abala a confiança dos agentes econômicos.
Falha na calibragem e ausência de compensações
Embora a alíquota de 5% possa parecer modesta em comparação com outras aplicações financeiras, ela representa um aumento significativo no custo efetivo do crédito para os setores produtivos. O governo não apresentou medidas compensatórias para manter o fluxo de financiamento ao agronegócio e ao setor imobiliário, nem considerou alternativas menos prejudiciais ao financiamento produtivo.
A ausência de gradualismo na implementação e de mecanismos de compensação evidencia uma visão de curto prazo, focada exclusivamente na arrecadação, sem considerar adequadamente os efeitos colaterais na economia real.
No curto prazo, é provável que ocorra uma corrida por emissões de LCIs, LCAs e Rs antes da implementação da tributação, buscando aproveitar a janela de isenção. No médio prazo, espera-se uma reestruturação do mercado de crédito para esses setores, com possível desenvolvimento de novos instrumentos ou adaptação dos existentes.
O impacto efetivo dependerá da reação do Congresso à Medida Provisória e de possíveis ajustes na proposta original. A mobilização dos setores afetados, especialmente o agronegócio, que possui forte representação parlamentar, será determinante para o desfecho da questão.
A decisão do governo de tributar LCI, LCA e R representa mais um erro com potencial impacto negativo no agronegócio e na economia brasileira. Embora a necessidade de equilíbrio fiscal seja legítima, a escolha de instrumentos e o método de implementação revelam falhas de planejamento e coordenação política.
A experiência internacional demonstra que políticas fiscais eficientes devem equilibrar a necessidade de arrecadação com o estímulo à atividade econômica. No caso em análise, o foco excessivo no curto prazo pode comprometer objetivos estratégicos de longo prazo, como a segurança alimentar, o desenvolvimento do agronegócio e a expansão do mercado imobiliário.
O governo está cada dia mais perdido e o resultado está na última pesquisa.
Que chegue logo 2026, pois vai faltar areia no deserto.