Data do padroeiro de Campo Grande serve de união entre a comunidade católica e aqueles fiéis que buscam alcançar uma graça do "santo das causas impossíveis"
Apesar do frio ter segurado alguns dos fiéis um pouco mais na cama na manhã desta sexta-feira (13), quem saiu cedo em busca do bolo do popular santo casamenteiro encontrou um verdadeiro festival de alianças durante a retirada na Catedral Nossa Senhora da Abadia e Santo Antônio em Campo Grande.
Como no caso da católica de nascença, Fabíola Falcão, que após conseguir pegar uma aliança em 2024, como acompanhou o Correio do Estado, repete o feito neste ano, sendo a oitava vez encontrando o objeto entre o tradicional bolo de Santo Antônio.
Entretanto, para ela, a emoção da conexão e sinal de sua fé para ela é tamanha que Fabíola ainda é tomada pela vontade de chorar.
"Eu venho todo ano... na minha vida toda eu fui devota de Santo Antônio. Vamos ver se a gente vai arrumar um casamento ou então um namorado", comenta.
Preste à fazer aniversário, no próximo dia 20, segundo ela, Fabíola considera o achado um "presentão" e ainda espera que a hora certa de arrumar um companheiro irá alcançá-la.
E se o frio ainda segurou uns e outros um pouco mais na cama, o que resultou em um cenário diferente das longas filas que se formam em busca de retirar o bolo, a "friaca" não teve força suficiente para abalar a graça de Santo Antônio e a fé daqueles que acreditam.
Isso porque não há nem necessidade de ser adepta da tradição há tempos para ter a sua graça alcançada, como no caso de Maria do Carmo, que pela primeira vez comprando o bolo deu a "sorte" de encontrar uma aliança.
Nascida em Fátima do Sul, a sul-mato-grossense se criou na cidade de Campinas mas há 30 anos mora em Campo Grande, e apesar das andanças nunca deixou de lado a fé católica, berço no qual nasceu.
"Olha, não conta pro Santo Antônio, mas eu sou devota de São Judas Tadeu... mas a gente montou um grupinho aleatório para fazer uma caminhada no Morro do Ernesto, sem nem ter a ver com o Santo, só que combinamos de nos encontrar aqui e receber a benção, mas o povo não chegou ainda", revelou ao Correio do Estado.
Sem sequer ter comprado o bilhete com antecedência, aos 51 anos Maria do Carmo aproveitou que a fila estava pequena e foi movida a comprar "apenas para ajudar" o trabalho da comunidade.
Ao comprar o bolo pela primeira vez na vida, ela que inclusive já foi casada mas está divorciada, espera que Santo Antônio tome uma providência em sua causa.
Comunidade católica
Com cada um processando sua fé como lhe cabe, há aqueles que aproveitam a data para estender a graça de Santo Antônio à família e aos amigos, como Angélica Vivian, devota da Catedral há cerca de dois anos e aproveitou para vender os bilhetes e levar os potes de bolo até as casas dos compradores.
Entregando 34 bolos de Santo Antonio de casa em casa, ela revela que conhecia Santo Antônio inicialmente da tradição, de que se virá-lo de cabeça para baixo a pessoa irá casar, mas expõe que se sentiu atraída quando se aprofundou em quem foi essa figura católica.
"Vi que não era só casamenteiro, a vida dele, quem conhece Santo Antônio não vai só pelo lado do matrimônio, mas sim pela fé divina. Ver que a igreja católica é incrível, tem esses mistérios, essas dádivas, e quem conhece não larga", cita.
Estudante de agronomia, a jovem de 22 anos está noiva há quatro meses e faz questão de ressaltar que o que chama de "presentão" não veio pela graça de Santo Antônio, mas que se espelha na figura para estreitar sua fé católica.
"Acho que todos os dias, pela forma que ele ama Deus, é uma forma de se comparar á ele, para você ser pelo menos um pouquinho daquilo que Deus quer", diz.
Jaqueline Barros é outra que saiu carregando sacola cheia de bolos, uma devota há pelo menos 15 anos que já pegou alianças três vezes e alcançou sua graça à época de conseguir ingressar na faculdade que queria.
"Como moro aqui perto, estou pegando para mim, sim, mas tem a família e uma parte das amigas também", comenta.
Novos tempos
Neste ano, mantém-se a disponibilização de três mil alianças, apesar de que o bolo desde a época da pandemia já não é mais o mesmo, deixando o tradicional formato de metros para uma versão distribuída em potes por meio de drive-thru.
Sobre isso, o pároco da catedral, padre Wagner Divino de Souza, comenta os desafios de continuar sendo fiel à mensagem de Jesus Cristo, colocando ela a partir do tempo em que vivemos, numa dinâmica que ele considera dada pelo Espírito Santo.
"A ousadia de atualizar a mensagem da salvação no tempo que nós vivemos. É verdade, o tempo da pandemia nos deu esse upgrade, antes nós não pensávamos que iríamos evoluir para o sistema do drive-thru hoje", lembra.
O padre é didático ao dizer que a comunidade precisa perceber a prova e convicção de uma fé, para só assim permanecer em um lugar, complementando nesse sentido dizendo que pessoas dos quatro cantos de Campo Grande buscam esse ponto.
"As pessoas voltam sim a Santo Antônio, porque ele tem um testemunho que fala por si só. Tem uma frase dele que inclusive acho que relata bem isso, dizia: 'cessem as palavras, falem as obras'".
Por esse ano de 2025 ser de Jubileu Extraordinário, o Padre é categórico em dizer que isso trouxe um "plus de alegria" para a comunidade católica que se envolve na confecção do bolo.
"Porque a igreja catedral é uma das jubilares, é a igreja por excelência na diocese. E os devotos aqui de Santo Antônio, o povo aqui da paróquia, Literalmente, eles vestem a camisa no sentido mais puro e mais perfeito da palavra", diz.
O padre revela a multidão envolvida na confecção de bolos, com turnos em três períodos com mais de cem pessoas juntas por vez.
"Não dá pra gente fazer isso sem ter pessoas compromissadas com o Evangelho".
Sobre a fama de "casamenteiro", o padre conta que isso remete à meado do século XIII na Europa, enquanto algumas mulheres precisavam oferecer dotes à família do noivo e Santo Antônio, por ser de família abastada, oferecia ajuda silenciosamente, contribuindo para que esses matrimônios se realizassem.
"A igreja já via nisso alguém sensível à questão da dificuldade do outro, ao problema do outro. Daí nós brasileiros temperamos isso e realmente transformamos Santo Antônio nesse homem santo que protege, que abençoa as famílias", conclui.
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